O protesto sobre a morte da bezerra
Acho muito tocante as pessoas se importarem com os “direitos dos animais” e também com a crueldade dos caçadores de pele, afinal, coitada das focas do Ártico que sofrem com a extração de sua pele somente. Coitadas também das vaquinhas, que ao invés de pastarem livres por aí em um tipo de idolatria sacra, como ocorre na Índia, viram bifes e vão pro prato.
Tudo bem, vou parar com ironias. Falando sério mesmo, eu acho um absurdo sim quando matam animais para alimentar o comércio de peles e não usam o resto todo, não se aproveita mais nada e as carcaças são deixadas lá apodrecendo ao ar livre, tal como fizeram e fazem com os elefantes na África e com um tanto de outros animais. Também respeito a opção dos vegans e outras variantes de vegetarianos que decidiram parar de comer carne ou derivados por um motivo qualquer, afinal, é livre ao ser humano decidir o que quer fazer.
Acho muito válidos os protestos feitos por essas pessoas, afinal, alguém tem que se preocupar com alguns problemas que a maioria nem liga, senão muita porcaria acontecesse, mas porque diabos eles gastam a vida lutando para que as vaquinhas não morram e não movem um dedinho sequer para protestar para algo que realmente valha a pena? Por que não protestam pela educação? Se essa galera que não come carne acha que realmente está errado comer carne e maltratar os bichinhos, então porque não possibilitam que outras pessoas o saibam também? Não, não adianta educar falando sobre o consumo de carne ou vegetais, mas sim educar para que as pessoas possam pensar e chegar a sua próprias conclusões!
É super bonito fechar o trânsito e arrumar abaixo-assinado para acabar com a farra do boi, não é? Também é super legal fazer com que os rodeios parem, afinal, eu não gostaria de um maluco sentado nas minhas costas e socando a espora na minha anca. Só que eu poderia estar arrumando assinaturas para coisas relevantes, coisas que realmente fizessem as pessoas se transformarem em cidadãos pensantes.
Direciono isso para os vegetarianos e “revoltados de grama1”: se vocês acham que seu ponto de vista está tão certo e que as pessoas não são tão esclarecidas quanto vocês, então porque não levar conhecimento para a população? Se ser inteligente é não comer carne e lutar pelo direito dos animais ou pela ecologia, então vai ser natural que todo mundo se importe com isso também, não é mesmo!
Sei que muitos dos defensores dessas “futilidades” vão dizer que o ser humano “não presta” e usar argumentos derivados a visão apocalíptica e semi-darwiniana do auto-extermínio, que o ser humano não merece consideração, que ele é cruel por natureza e outro monte de coisas que sacam das mangas para justificar uma frustração ideológica. Não adianta utilizar essa fórmula, pelo menos não contra mim, pois eu acredito em tudo o que falam sobre o ser humano, mas acredito que as pessoas só são cruéis porque lhes é permitido fazê-lo e a grande maioria o é por conta da ignorância.
Não estou ironizando aqui, estou falando sério. Quando criamos pessoas com consciência podemos exigir delas postura quanto a assuntos de menor relevância? Tá, não quis dizer que são frivolidades os direitos dos animais e nem quero ouvir aquele discurso todo que eu já conheço sobre a igualdade dos animais, que eles também tem direito a nosso planeta e toda aquela retórica ecológica, acredito em muito dela, mas acho que o ser humano deveria ser educado em primeiro lugar para que soubesse seu papel no mundo e na sociedade.
Não adianta você criar um monte de preenchedores de formulários e de gabaritos, não adianta fazer com as pessoas apenas aprendam a escrever e não adianta também utilizar os métodos dos políticos que é o de fazer “propaganda” sem que o outro lado esteja pronto a receber ou processar qualquer tipo de mensagem. É necessário que sejam criados agentes da transformação e que as pessoas possam por si só acordarem para o que é certo ou errado, mas para isso é necessário que elas tenham meios para fazer essa análise.
Acredito que protestar contra o consumo de carne, exigir que o alimento orgânico seja prioridade, para que os transgênicos sejam retirados de nossas plantações, que parem de matar o papagaio do rabo rosa ou mico-leão-anão-de-bolsa-bege é perda de tempo. É o mesmo que fazer um protesto pela paz.
Não adianta mostrar a comoção popular para um assunto quando os assuntos realmente relevantes e que poderiam criar mais pessoas contestadoras não são tratados com seriedade. Reforço que acho super legal a movimentação para esses “protestos”, mas acredito que a preocupação deveria ser com o processo de educação e o acesso a informação igualitária.
Nosso país é formado por analfabetos funcionais que não conseguem discernir sobre certo e errado quando lêem um texto, não conseguem compreender os abusos de um governo que exigem mais deveres do que dá benefícios. Além disso, a população desconhece os seus direitos básicos, desconhece a Constituição e o Código Civil, não sabe o que lhe é garantido pelos Direitos Humanos e também não consegue entender o que está escrito em qualquer um desses documentos. Nossos cidadãos não sabem nada disso e duvido que a maioria das pessoas que estão lendo este texto também o saibam. Pensem e citem sem consulta apenas um direito garantido a vocês pela Constituição ou, melhor ainda, qualquer um dos direitos que está lá no estatuto dos Direitos Humanos.
Como você pode exigir que alguém então respeite o Direito dos Animais se não conhece os Direitos Humanos? Como você quer pedir por paz se as pessoas não sabem o que isso significa?
É preciso criar cidadãos, pessoas que saibam em que contexto estão inclusas. Também é necessário educar para que essas pessoas tenham sim direitos iguais a todo mundo: direito a informação, ao ensino e a inserção na sociedade.
Depois da educação, você pode então lutar por uma distribuição igualitária de renda, pela melhoria na saúde, pelos animais, pela não poluição das nossas reservas de água potável, pela preservação das espécies nativas, pela eliminação de atos cruéis contra os seres humanos E contra animais, pela geração de emprego em Itapopoca do Sul2 e por aí vai.
Quando você cria pessoas que tenham poder de questionar a sociedade e o seu papel no mundo, você cria pessoas que possam melhorar quaisquer dos assuntos discutidos em diversas mesas de bares pelo Brasil afora, sem contar que você leva as discussões para fora das mesas de bares e consegue que elas entrem nos palcos de ação, onde deviam estar inseridas desde o início para que as mudanças ocorressem de fato.
Pense sobre o assunto e veja que é muito fofinho pensar em você salvando um coelhinho felpudo de virar chapéu no inverno, mas pense que quando você cria pessoas que pensem terá mais gente se preocupando com o mesmo coelho e que pensar bonito não muda a nossa realidade.
Também tenha em mente que o governo não vai fazer nada para mudar essa realidade, pois quanto mais pessoas sem poder de raciocínio, mais gado para manipular para que os interesses do Estado sejam defendidos, ou melhor, para que os interessas da minoria que o Estado representa – as pessoas que tem dinheiro. Quanto mais gente burra, mais votos para os candidatos quando eles beijam crianças no colo e tiram o lixo das praias – e olha que ele só precisa fazer isso uma vez a cada quatro ou oito anos.
1“Revoltado de grama” no dicionário Poesístico, se refere às pessoas que ingressam em universidades públicas, sejam federais ou estaduais, e ficam o dia todo com a bunda sentada na grama, fumando seu cigarrinho, viajando na batatinha, vendo o mundo passar e resolvem, de tempos em tempos, tirar a bunda de lá para fazer protestos sobre assuntos que surgem durante as suas “introspecções”.
2“Itapopoca do Sul”, no dicionário Poesístico, se refere a qualquer cidade em qualquer canto do país, não importando quão longe ela esteja e nem mesmo o seu número de habitantes ou importância econômica.