“A dura Realidade bateu a minha porta”, o clichê bateu na minha cabeça como se alguém tivesse me chutado as muletas – e olha que eu ando bem com as duas pernas (excluindo-se o fato de que não sei porque diabos estou com uma dor intensa na virilha). Porém, a Realidade nem era dura e nem bateu em minha porta, nem metáfora e nem clichê.
A Realidade era uma gorda flácida que já não malhava há alguns anos. Estava velha e não conseguia nem mesmo levantar o copo de vodka e dar uma baforada em seu charuto baiano (os cubanos estão fora de moda para ela).
Não bateu a minha porta, por dois motivos simples: primeiro, ela não conseguia bater com força pra se fazer ouvir, como já mencionei; segundo, eu não tenho portas para que ela bata, com esse calor deixei tudo aberto.
Então, refazendo a frase: “A gorda flácida e velha da Realidade entrou meio que rastejando, meio que mancando, pela porta aberta – e no caminho derrubou algumas das minhas garrafas de vodka”.
Bem melhor assim, mais sincero.
Depois que a gorda flácida entrou pela porta, sentou-se devagar em meu sofá e acendeu seu charuto baiano. A casa cheirava como um terreiro de umbanda, mas não sei porque me lembrei do túnel da 9 de julho.
Quando ela estava lá, sentada, comecei a perceber que a realidade não era tão cruel assim, era algo pra você sentir pena - o jeito que ela falava era uma mescla entre travlon velha e frentista de posto de madame. A cada duas palavras havia uma pausa para retomar o fôlego. Foi aí que a gostosa da Fantasia entrou correndo saltitante pela sala! A cada golada da Realidade em uma das minhas vodkas (uma das que ela não havia quebrado), a Fantasia aproveitava pra me passar alguma cantada.
Conclusão? Poderia ser: “quando a Realidade lhe parece uma velha gorda, flácida e que cheira a terreiro de macumba, aproveita e usa a vodka pra flertar com a Fantasia”. Só que eu prefiro a mais crua: “o negócio está batendo até agora ou são os quatro comprimidos de anti-inflamatório muscular que eu tomei?”.
Fim.