5.7.06

A política das religiões

Cada uma acredita no que quiser, afinal, religião ou igreja pra mim é sinônimo de entidade política. Acreditar em uma série de costumes, mitologias ou ideologias é apenas o que trouxe a humanidade a seu estado atual, não haveria progresso sem a fé – seja ela em entidades místicas, etéreas ou no próprio homem.

Daí a gente é bombardeado por pérolas na mídia que merecem, com todo o meu carinho e atenção, a dedicação de tempo para entender o que leva o ser humano a ser escapista dessa forma.

Li no Jornal hoje sobre processos civis contra entidades religiosas e achei engraçado como as pessoas cobram soluções mágicas da religião. O apelo do ser humano para o divino sempre existiu, mas é o cumulo entregar sua vida inteira para algo etéreo – é aí que a fé se explica e onde a humanidade se complica.

Coisas como “vender todos os bens e entregar para a Igreja” ou “fazer sacrifícios pessoais” são atitudes comuns entre as pessoas desesperadas ou crentes demais, tudo para poder obter algo em troca, alguma graça ou reconhecimento. No final ninguém faz nada pela fé, mas sim por um benefício desejado. Não se acredita no melhor para o homem e não se acredita que se deve fazer o certo porque é apenas certo, mas sim porque vai lhe garantir um lugar no céu ou vai te curar do câncer.

Ninguém faz nada apenas porque que acredita no melhor, mas sim porque quer obter algo em troca – e se for rápido ou imediato, melhor ainda!

Daí aparecem os espertalhões que vêem uma ótima chance para se aproveitar do desesperado dos “fiéis” e fazem nascer suas Igrejas, templos ou seitas. Aparecem novos santos, novos salvadores e novos iluminados, tudo apoiado no desespero da maioria, que ao invés de pensar em uma forma de melhorar as coisas entrega tudo na mão de Deus (ou qualquer outro nome que o valha) e de uma minoria que o representa – nascem os podres sacro-políticos, onde manda quem é enviado por entidades superiores acima do entendimento do mero mortal.

Só que uma hora as pessoas acordam e resolvem processar a Igreja porque eles não cumpriram suas promessas! Super legal, acho muito válido, mas afinal, qual é a promessa que não foi cumprida? Não posso alegar falta de fé para defender o meu culto? Não posso falar que o fiel não acreditou o suficiente e por isso Snorkel, o Deus dos Mergulhadores, não fez a sua mulher voltar a amá-lo ou sua empresa de mergulho turístico nas ruínas de Atlantis ir para a frente? Sim, eu posso, porém, não posso negar que eu pedi para você me dar toda a sua grana para construir um templo e não lhe garanti de forma física que aconteceria algo. Ah, e não, você não tem problemas espirituais, o que você tem é ingenuidade inerente ao ser humano e eu sou mais espertinho que você – falo que sou um iluminado e que Snorkel, O Condutor, escreve certo por linhas tortas e te encho de aforismos estúpidos para que você fique pensando que realmente ele te ajudou!

Santa estupidez, oh, Snorkel! O pior de tudo é que as pessoas agem assim mesmo e vão acreditar, mas vão adorar receber a indenização em dinheiro para que os lucros recebidos sejam solidificados por vez.

E nesse intermédio eu vou culpando pelas merdas do mundo o Orkut, a Internet, a televisão, as novelas, o cinema, a pelada (não, não é a Mariana do Big Brother), o futebol (só porque o Brasil perdeu, se ganha-se não estava na lista), os livros, a razão, o Faustão, a Belíssima (só por essa semana), o Lula, o Alquiminho, a Coréia do Norte e o que venha mais (eu tenho certeza que o top dessa lista ainda é o RPG, mas não é in falar mal do jogo, droga!).

A matéria que gerou isso tudo está presente na Folha de São Paulo e tem como título “Ex-fiéis vão à Justiça pedir indenização de igrejas”, vou colocar ela na íntegra abaixo:

Ações cobram recompensas por promessas que não foram cumpridas

Pastor disse que, se tivesse fé, homem não cairia do telhado do templo que consertaria; caiu e sofreu politraumatismo

JOÃO CARLOS MAGALHÃES
MATHEUS PICHONELLI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Eles depositaram fé e recursos em quem lhes prometeu dias melhores. Até que, cansados de esperar a providência divina, resolveram pedir o seu dinheiro de volta. São ex-fiéis desapontados que cobram na Justiça indenizações por danos morais e materiais.

Nas estantes de fóruns e do Tribunal de Justiça de São Paulo, casos de pessoas que investiram dinheiro em promessas (desde a celebração de um casamento até o enriquecimento imediato) esperam agora da lei dos homens uma sentença.

As histórias de Maria e de Carlos, ex-freqüentadores da Igreja Universal do Reino de Deus, ilustram essa situação. Eles reclamam na Justiça terem vendido bens, como apartamentos e carros, em troca de prosperidade financeira que não foi alcançada.

Já um católico cobra a devolução de R$ 1.500 pagos para o casamento. Ele pediu o cancelamento dizendo que o padre interferia nos preparativos. O pároco se negou a devolver o dinheiro, e o caso foi à Justiça.

"Quis dias melhores e tudo que me deram foi porrada", conta o padeiro desempregado José Leite. Ele diz ter participado de sessão de descarrego na Universal, na qual o auxiliar do pastor, ao tentar exorcizá-lo, bateu sua cabeça no banco.

Ele quer R$ 5.000 por danos. O pedido foi considerado procedente, mas a igreja apelou. Já Nelson ouviu do pastor que, se tivesse fé, não cairia do telhado que consertaria no templo da Universal. Caiu, teve politraumatismo e requereu R$ 356.200 de indenização. O pedido foi julgado procedente.

"É muito difícil provar que o fiel é ingênuo e foi induzido. Fé não pode ser mensurada", diz Adriano Ferriani, professor da PUC-SP e especialista em responsabilidade civil.

JOÃO CARLOS MAGALHÃES e MATHEUS PICHONELLI participaram do 41º Programa de Treinamento em Jornalismo Diário da Folha , que foi patrocinado pela Philip Morris Brasil
NA INTERNET - Leia a íntegra de entrevistas e mais casos em www.folha.com.br/061715


Ah, também é preciso colocar aqui a matéria “resposta” que veio na seqüência dessa, que vale a pena:

Advogada nega fatos e acusa fiel de traição

COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

A advogada da Igreja Universal do Reino de Deus Adriana Guimarães afirma que todos os argumentos levantados nos tribunais por antigos fiéis são mentirosos. Segundo ela, os pedidos de indenizações possuem valores altos porque muitos vêem a Universal como uma entidade rica e tentam obter vantagens financeiras.

"Essa Maria freqüentou a igreja durante quase dez anos. Como alguém pode ter sido enganada tanto tempo?", diz a advogada. "É meio que uma traição."

Quanto a José Bezerra, ela diz que se trata de "um oportunista". "Nós provamos na Justiça que a lesão dele era antiga. O juiz julgou com preconceito, como a maioria das pessoas faz com a Universal."

Evangélica, Adriana faz parte de um corpo jurídico formado por 14 advogados da Universal em São Paulo. Ela acredita que os ex-fiéis "têm problemas espirituais".

A Folha relatou o caso do casamento não realizado à assessoria da Cúria de São Paulo, que não telefonou de volta até a conclusão desta edição.

A reportagem enviou e-mails à CNBB, pedindo esclarecimento sobre uma ação por uso indevido de imagem, mas também não obteve resposta.

Para o advogado da Congregação Cristã no Brasil Paulo Sanches Campoi, a liberdade de organização e doutrina das igrejas não pode ser analisada por uma lei humana.