18.4.07

Gerun... odiando!

"Eu vou estar morrendo, para estar te salvando" - Gerúndio de Jesus*

Por diversas vezes recebi telefonemas de operadores de celulares ou de alguém oferecendo produtos bancários em meu telefone celular e em todas essas ocasiões fui abordado por frases como “vou estar encaminhando para que o senhor esteja analizando” ou “gostaria de estar obtendo informações de como estar ajudando o senhor”.

Alguns poucos iluminados (salve-os, óh, Razão!) devem saber o que está errado: é gerúndio demais funcionando como verbo auxiliar quando não era para ser assim! Tudo bem, você não lembra direito o que é gerúndio, pra refrescar a memória, de uma forma bem simplista, gerúndio é aquela forma verbal que dá impressão de continuidade – quando a gente solta um “estamos jogando” fazemos com que o verbo dê impressão de fato presente que vai se estender (outra forma de se identificar um gerúndio é por sua terminação em “ndo”, tal como em “falando”, “fazendo” e “imprimindo”).

Não vou dar aulas aqui sobre isso, mas é que estou ficando irritado com a insistência das pessoas em usar esse monte de “ndo” e afins! Dá vontade de pular no pescoço.

"Gerundismo" de merda! (Olha, esse nome enche a boca, parece até nome de um movimento intelectual ou político – como o socialismo, facismo, niilismo, etc. Vou montar um partido Gerundista, lembra até o tal do Getulismo! Ficaria bem próximo do Populismo, se eu pensar que o que é popular vem do povo - está bem, eu sei que populismo não quer dizer isso, foi uma piada infâme!)

Eu sei que usar de gerundismo pelas empresas de telemarketing é uma estratégia para aproximar o cliente do atendente, pois cria uma impressão de intimidade. Às favas essa intimidade, ela é tão irritante quanto o fofolês (“c qé c meu miguxxxxo? adooooooruuu vc!”) e mais imbecil porque está repetindo uma intimidade falsa de alguém que não te conhece, não é teu amigo e quer, na verdade, ferrar com você (ou você acha mesmo que aquele vendedor de assinatura de jornal “vai estar facilitando a forma como vai estar cobrando e dividindo as suas parcelas”?).

Ouço as pessoas por aí falando desse jeito e me irrita, mas na verdade, eu relevo, afinal, tem tanto erro pior aí no “protugueis” e a linguagem falada é algo mais solto mesmo (no fundo, eu até gosto dessa vida da língua, das novas expressões e afins). O pior de tudo é que eu vivo recebendo e-mails que não são SPAM, de pessoas entrando em contato e que tentam usar de um linguajar mais polido, mas em quase todas as frases existe um gerundismo de matar.

Poxa, é difícil pensar um pouco e até mesmo economizar no que se fala! Por exemplo, temos duas opções de falar a mesma coisa:

  1. Gostaria de estar obtendo informações sobre como estar falando com o dono da casa.
  2. Gostaria de obter informações sobre como falar com o dono da casa.

O primeiro item aí é o tal do gerundismo, no segundo aparece a forma correta de como escrever a frase. Não adianta, até falando isso é feio. Não seria melhor perguntar direto “Qual a forma de contato com o dono da casa?” ao invés de ficar fazendo rodeios? Sério! Parece besteira, mas estamos sendo invadidos por esse linguajar que vem crescendo, penetrando nas massas, afinal, quem é que ouve ligação de atendente de telemarketing? Claro que é a secretária do chefe, a dona de casa, a empregada, o cara que está devendo uma grana pra empresa de micro-crédito, o cara que está com todas “as conta” atrasadas... e por aí vai! A massa começa a falar assim e você passa a ouvir nas conversas de elevador coisas como: “Vou estar indo com o Valmir ao shopping para estar pegando um cinema! Não é incríiiiiiiivel?”.

Só pra deixar claro, antes que me fuzilem, não falei que a secretária é quem fala assim, dei um exemplo das massas.

Usando o exemplo da secretária: tenho um advogado com um escritório grande, então ele tem duas secretárias, uma para cuidar de sua agenda e outra especificamente para processar o atendimento telefônico (ela não é telefonista porque tem outras funções na empresa). Então, conclui-se que no mundo hajam mais secretarias que advogados, não é mesmo? Pelo menos o dobro! O mesmo vale para lojas, por exemplo, você tem um gerente e vários funcionários abaixo dele, então, o mundo tem mais funcionários do que gerentes. Concluímos então que a massa de pessoas é formada em sua maioria por funcionários no final da pirâmide (garçons, secretárias, caixas de banco, etc). Não se preocupe, não acho que o gerundismo seja problema "social" ou tem a ver com renda, é um fenômeno que não se prende a isso (quase como a AIDS, rs): tem gente sem grana que usa muito, gente da classe média, gente podre de rico, gente hetero, gente homo, gente do cinema, gente do teatro e gente da medicina - é a moda do momento!

Arghs!

Parece reclamação de velho, mas você não fica irritado também com isso? É todo mundo muito intimo, muito teu amigo quando começa a falar, mas no fundo, sinto-me como se alguém estivesse tentando vender para mim uma imagem e depois fosse te foder!

Oras, não é assim quando a operadora de telefonia vem oferecer os seus benefícios milagrosos e, no final, quando você vai cancelar o serviço ela te avisa que você só vai conseguir isso se pagar uma taxa de R$ 200,00 devido ao não cumprimento de uma cláusula que te mantinha preso ao serviço contratado?

Quando alguém me solta uma frase gerundiada é esse sentimento que jogo de volta contra a pessoa. Então, pessoal, nada de “vir me cumprimentado para estar me deixando nervoso”!

(* creditando a frase de abertura porque a idéia é do meu amigo Lucas Delmont, que concorda comigo que Gerúndio parece nome de retirante de livro do Jorge Amado).