A bola da vez é fazer o protesto, sair pelas ruas e pintar a cara. Vamos fazer o No Fly Day, ninguém vai pegar avião em um dia. Todo mundo em casa. Ninguém vai pegar um jatinho pra ir em reunião ou viajar para o Caribe. Todos em casa.
Morreram mais de 200 pessoas no acidente com o avião da TAM e foram tirados mais de 220 sacolas com restos mortais do local. Não se sabe ao certo de números de vítimas, pois o acidente se mescla com os desaparecidos que essa megalópole cria. No meio desses números e incertezas começam as especulações, elevam-se as iras e gente que não está envolvida diretamente com a dor das vítimas se solidariza e compra o pacote de indignação – quando na verdade, o problema de fato não é Congonhas, o problema não é a TAM e o problema também não é a crise aérea, o buraco é mais embaixo e está ligado em uma infra-estrutura genérica de transportes brasileira. Mesmo assim, vamos reclamar, vamos gritar, vamos protestar.
Oras, não é assim depois de uma grande explosão de violência? Na época do Carandiru era moda sair às ruas e gritar em prol dos direitos humanos dos presos, na época do Collor era sair gritando “impeachment já”, lá em 84 foram as diretas e logo depois da explosão de violência urbana em São Paulo deflagrada pelo PCC era pedir por paz.
Agora, qual foi o real resultado de todos esses protestos? Os direitos humanos passam a cabeça nas mãos dos presos e não se faz nada para mudar o sistema carcerário, penal e judicial brasileiro para que a palavra justiça seja colocada na frente da palavra arbitrarismo; o Collor saiu da presidência mas hoje é Senador, além de que a corrupção não diminuiu e só nos últimos escândalos envolvendo políticos e pessoal do ministério público o dinheiro envolvido deu mais que umas cinco Dindas; as diretas vieram, mas o voto é obrigatório e é só olhar lá pra presidência, pro congresso, pra prefeitura e para nossa câmara de vereadores para ver que não mudou muita coisa, aliás, nem mesmo na televisão, afinal, agora nós temos censura novamente; as pessoas pediram por paz, mas o índice de criminalidade não diminuiu, o PCC agora vive dentro de sua quentinha, a comunicação entre lideres criminosos com suas quadrilhas fora dos presídios ainda é uma realidade e ninguém reclama do excesso de força usada pela Polícia e pelo Exército para dar um “sossega leão” nos criminosos do Rio de Janeiro até que o Pan acabe.
Então, para que protestar contra Congonhas? Porque é moda, está na TV, nas capas dos principais jornais, da Veja, da Superinteressante, nos principais portais – e tem até canal especial no Terra e no UOL. Tudo isso para alimentar a sede por assunto, para mostrar toda a versatilidade e cultura na hora do happy hour em um botequim na Av. Paulista (ou na Rua Augusta, dependendo da ocasião, dia e hora).
Então, por que não protestamos sobre o descaso das autoridades com a população no geral? Tem a educação falha e tem a saúde moribunda. Tem também a falência sistemática de TODOS os sistemas de transportes – ou vocês acham que o problema é só a aviação?
Não temos malha viária para carros, não temos alternativas de transporte público que sejam minimamente aceitáveis e também somos cobrados duas vezes para usar esses meios ditos como alternativos. Os carros não andam, a cidade não tem uma extensão aceitável de metrôs, os trens não atendem toda a população e ainda por cima cobram do paulistano R$ 2,30 para pegar um ônibus ou metrô, sendo que a responsabilidade de manter o transporte é do governo e a gente já paga imposto para isso – sabiam que na Argentina andar de ônibus fica algo próximo a R$ 0,47 (tarifa única) e o quilometro do táxi custa algo como R$ 2,30 (sim, aqueles caras que você adora tirar sarro quando perdem no futebol ou em qualquer outro esporte tem mais o que comemorar no cotidiano do que a gente).
O pior, não temos obras de verdade para melhorar a infra-estrutura viária da cidade – a menos que você ache que o “Buraco da Marta”, reformas em viadutos, a Linha Amarela(ada) do metrô e o Expresso Tiradentes façam diferença na cidade (quando na verdade não passam de manutenção básica).
E depois, vem o governo Lula falar que está sobrando dinheiro da união e os outros órgãos que nos governam falar que a arrecadação pública só aumenta.
Que maravilha, vamos então protestar para melhorar congonhas, quando os outros 10 milhões de paulistanos nem mesmo sabem o que significa esse tal de check-in.
Creio que precisemos de verdade é fazer um No Way Day, para ninguém sair de casa, nem mesmo comprar pizza por telefone, nem ir ao cinema, nem ao shopping e nem ao Parque do Ibirapuera. Temos é que fazer um dia de “Chega de palhaçada” e organizar uma greve geral ou até mesmo um dia sem sair de casa. Chorem empresas de ônibus, chorem impostos que não serão recolhidos e dinheiro que vai parar de circular. No Fly Day o caralho, se nem português a gente fala direito, como é que vamos gritar um protesto em inglês? Se nem o nome do ônibus algumas pessoas sabem direito – mas é que ônibus não cai do céu, nem mesmo tem caixa preta (no máximo tem um assalto e a coisa fica preta).
O modismo do protesto não permite que pensemos, aliás, nós pensamos? Só no que a mídia coloca na capa dos seus jornais.
Bah!