12/04/2006
A opção militar contra o Irã ganha força em Washington
Várias publicações americanas respeitadas dão conta da realização de preparativos para uma intervenção nuclear aérea; o governo desmente
Corine Lesnes
correspondente em Washington
A opção militar contra o Irã, que por muito tempo foi vista como pouco praticável, já passou a ser considerada abertamente em Washington. Os que não acreditavam nela mudaram de opinião. "Até recentemente, eu atribuía essas hipóteses de ataques militares a iniciativas de 'blogueiros' ou de adeptos das teorias da conspiração", explicava, dias atrás, o especialista Joseph Cirincione. "Agora, a minha hipótese de trabalho é que certos membros da administração, entre os quais o vice-presidente (Dick Cheney), decidiram que a opção preferível é de atacar o Irã, o que desestabilizará o regime".
Um especialista reputado nas questões de proliferação nuclear, Cirincione acaba de publicar na revista "Foreign Policy" um artigo intitulado: "Me enganem duas vezes". Nele, Cirincione estabelece um paralelo entre a situação atual e o período que antecedeu a guerra no Iraque. Atualmente, a retórica oficial passou a pressionar mais. Agora, o Irã é qualificado de "ameaça principal".
Simultaneamente, diversos vazamentos na imprensa reforçam a idéia segundo a qual o programa nuclear iraniano poderia ser muito mais adiantado do que se pensa. "Isso me lembra a campanha muito coordenada que nós observamos antes da guerra no Iraque", analisa.
Joseph Cirincione não deve ter se sentido nem um pouco tranqüilizado com a leitura dos jornais durante este fim de semana. Em primeira-página, o "Washington Post" informava, no domingo (9/4), que os Estados Unidos vêm se preparando para uma confrontação com Teerã, enquanto eles prosseguem paralelamente suas articulações no quadro diplomático, efetuando aquilo que o diário chama de um exercício de "diplomacia coercitiva".
Nenhum ataque é "provável a curto prazo", sublinha o "Washington Post", mas os alvos foram repertoriados, a começar pela usina de enriquecimento de urânio de Natanz, mesmo se a amplidão dos ataques ainda não foi decidida (conheça as diferentes opções possíveis na lista abaixo).
No jornal semanal "The New Yorker", o jornalista Seymour Hersh afirma, ele também, que os preparativos já alcançaram o estágio operacional. Ele menciona, sobretudo, que o recurso a armas nucleares táticas não está excluído para destruir construções dissimuladas a mais de 20 metros debaixo da terra.
Segundo este jornalista, autor de vários "furos" de notícia no campo militar, os responsáveis das forças armadas ficaram surpresos, e, no caso de alguns deles, chocados, quando receberam um pedido para conservar a possibilidade de ataques nucleares, enquanto eles queriam excluí-la de antemão.
A credibilidade de tais informações é difícil de estabelecer. Em todo caso, elas se tornam de conhecimento públicos num momento crítico, quando uma queda-de-braço vem sendo travada entre o Irã e o Conselho de Segurança.
A ONU deu a Teerã até o final do mês de abril para abandonar suas atividades de enriquecimento do urânio. O diretor da Agência Internacional da Energia Atômica (AIEA), Mohamed ElBaradei, deve viajar nesta quarta-feira para Teerã, segundo revelaram diplomatas próximos à AIEA. Conforme explicou um dirigente anônimo em entrevista ao "Washington Post", trata-se principalmente de convencer os iranianos de que "tudo isso está ficando cada vez mais sério".
O chefe da diplomacia britânica, Jack Straw, considerou "maluca" a hipótese de um recurso à arma nuclear. O porta-voz do ministério iraniano das relações exteriores, por sua vez, indicou que o Irã não está nem um pouco impressionado com esta "guerra psicológica" que os Estados Unidos vêm conduzindo "por desespero". O antigo rival do presidente Bush, o democrata John Kerry, falou de "diplomacia de cow-boy".
Contudo, as revelações foram consideradas como sérias o bastante para que o conselheiro para a comunicação do presidente Bush, Dan Bartlett, achasse por bem prestar alguns esclarecimentos já no domingo. Os Estados Unidos estão conduzindo "preparativos normais, seja no plano militar ou no da inteligência", disse. "E a diplomacia continua sendo a "prioridade" do presidente Bush", acrescentou.
A opção militar vem ganhando terreno. Confrontados ao fantasma de uma guerra civil no Iraque, vários responsáveis americanos estimam que eles não vão conseguir estabilizar o Iraque ou o Afeganistão enquanto o Irã ou a Síria incentivarem a insurreição e o terrorismo.
Existe um outro fator de peso: George W. Bush está cumprindo seu segundo mandato presidencial e não poderá, portanto, se candidatar em 2008. Segundo Seymour Hersh, o presidente Bush se considera como o único dirigente capaz de ter a "coragem" de impedir o Irã de se dotar da arma atômica.
Os cenários possíveis
Ataques: Apenas ataques aéreos estão sendo considerados, diferentemente do que ocorreu com a invasão do Iraque.
Modalidades de ataque: O Center for Strategic and International Studies (CSIS) fez um levantamento de diversas opções:
- tiros de reprimenda: alguns mísseis de cruzeiro, para mostrar a seriedade dos Estados Unidos, atingem ao menos um dos centros suspeitos.
- ataque limitado com 16 a 20 mísseis de cruzeiro. Apenas os centros
- nucleares seriam alvejados.
- ataque de maior proporção contra as instalações militares: 200 a 600
- mísseis de cruzeiro, além de reides aéreos durante um período de três a dez dias.
- ataque maciço durante várias semanas contra as instalações militares e civis: 1.000 a 2.500 mísseis.
Armas nucleares táticas: O jornal semanal "The New Yorker" evoca a utilização de armas nucleares anti-fortalezas subterrâneas do type B61-11 para destruir a principal usina nuclear iraniana, situada em Natanz.
"Pura especulação", segundo o presidente Bush
O presidente americano qualificou, na segunda-feira (10), de "pura especulação" as recentes informações sobre os preparativos para um recurso à força militar contra o Irã. "Eu li os artigos nos jornais neste fim de semana. Tudo isso é simplesmente pura especulação", declarou George W. Bush por ocasião de uma reunião pública em Washington.
"A doutrina da prevenção consiste em trabalharmos juntos para impedir os iranianos de terem a arma nuclear", disse Bush. "Eu sei que aqui, em
Washington (...), prevenção quer dizer recurso à força, [mas] isso não quer dizer necessariamente recurso à força. No caso, isso quer dizer diplomacia".
Esta notícia foi publicada pelo jornal "Le Monde" e está acessível para assinantes do UOL na URL http://noticias.uol.com.br/midiaglobal/lemonde/2006/04/12/ult580u1926.jhtm.
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