2.6.05

Em algumas leituras que fazemos no decorrer da vida, acabamos por encontrar pérolas onde não imaginávamos que elas poderiam residir. Acredito piamente que a leitura é uma forma essencial de discussão consigo mesmo e que, em alguns casos, você consiga absorver pensamentos necessários para a sua condição de ser.

Enquanto vivemos nossas vidas corridas, aceleradas a cada dia por uma inovação tecnológica que vem para nos dar mais tempo de ociosidade mental, acabamos por perder momentos de amadurecimento do Ser. Vivemos em um mundo capitalista, onde o ter é colocado acima do ser - acabamos por não dar brechas para o desenvolvimento humano e nos tornamos objetos, muitas vezes inúteis, em um panorama que nos é comum. O cotidiano é cruel e triste para aqueles que não enxergam a riqueza das pequenas coisas.

Por que inicio um discurso com esse tom? Simples! Nos últimos meses ando resgatando algumas leituras que me fizeram algumas modificações quando eu era adolescente, mas a minha "imaturidade intelectual" não me permitiu a real absorção das linhas que digeri. Acredito piamente que o ser humano deveria ser obrigado a absorver informações em dois instantes de sua vida. O primeiro deles para que a informação lhe fosse apenas ferramenta para o desabrochar de seu intelecto e o segundo para que o intelecto lutasse com aquela informação para que este gerasse suas próprias impressões sobre o tema.

A leitura é essencial e a discussão consigo mesmo (ou com outras pessosa) mais importante ainda. Quando li "1984" de G. Orwell meu mundo foi moldado uma vez, mas todos os anos repito essa leitura. Outras lições maravilhosas tirei de livros como "A revolução dos Bichos" (do próprio Orwell), "O Senhor dos Anéis" de Tolkien, "O Pequeno Príncipe" de Saint Exupèrry, "Tistu, O menino do Dedo Verde" de Maurice Druon, "A femonologia do Espírito" de Hegel, "Cândido ou O Otimismo" de Voltaire, "Hamlet" de Shakespeare, "Frankstein" de Mary Shelley e tantos outros livros que nem posso contar. E não foram só os autores estrangeiros, acho que Monteiro Lobato e Fernando Pessoa conseguiram fazer modificações sem tamanho em mim.

Com essa pequena lista de coisas que um dia eu já coloquei em minha cabeça garanto que já dou um panorama do que pode criar um ser pensante. Certo que muitos dos questionamentos que nasceram dessas leituras são particulares e nem podem ser divididos de forma idêntica com outras pessoas, mas garanto que a ótica humana aumentou muito quando os absorvi - você deixa de ser apenas um e passa ser parte de um coletivo de pensamento, com suas particularidades impressas no seu modo de pensar.

Ultimamente resolvi ler alguns livros que me fizeram crescer em muito - e olha que com 25 anos nas costas as pessoas tendem a achar que tem pouco a se desenvolver como individuos; só que eu não penso assim! Reli "Neuromancer" do William Gibson e fiquei surpreso como um livro de ficção científica pode mudar tantos aspectos do pensamento; isso aconteceu também quando, pela primeira vez nesse ano, li "De Profundis" de Osca Wilde. Tudo isso porque em um sábado em que acordei com "vontade de ler" comprei alguns livros em livrarias e em sebos desses que ficam na Rua Augusta, bem perto da Av. Paulista. Agradeço por esses meus ímpetos consumistas!!!!

A última grande leitura que acabei por colocar na lista de "coisas que mudam você" foi o livro de Friedrich W. Nietzche, entitulado "Assim falava Zaratustra". O livro sempre me foi muito recomendado e falado, despertando curiosidade por diversos motivos. Este livro deu origem a uma das trilhas sonoras mais conhecidas do cinema (que não foi feita para o filme em si, mas sim faz parte da obra de Richard Straus) - o filme em questão é "2001, uma odisséia no espaço", de Stanley Kubrick - e por isso, talvez, sempre tenha me despertado a atenção. Só que eu nunca o havia lido; talvez por falta de coragem ou por receio dele ser complexo demais para a minha cabecinha loira (eu sempre duvidei de minha capacidade de entender as coisas).

Tomei coragem e comprei o livro, achando que o entenderia bem hoje e, se isso não acontecesse, que seria um desafio para minha mente. Por isso eu digo que tudo tem um momento em sua vida!!! Se eu o tivesse lido em outro momento talvez não tivesse surtido tanto e efeito e impacto. Ainda não o finalizei, admito, mas até o momento muito adicionou a meu modo de ver o mundo e, através dele, muitas de minhas idéias deixaram de ser estranhas. É ótimo ver como o meu modo de pensar já era "nietzcheniano" nestes aspectos - mesmo que eu já tivesse lido algo dele antes, nada se compara ao impacto causado por "Assim falava Zaratustra".

Vou transcrever um trecho da obra para que vocês entendam do que eu falo:

"(...) Ainda se reconhece nobre, assim como nobre se reconhecem os outros, o que estão mal com você e o olham com desprezo. Fique sabendo que todos encontram algum nobre no seu caminho.

Também os bons encontram algum nobre no seu caminho, e se lhe chamam bom é tã-somente para deixá-lo de lado.

O nobre sempre deseja criar alguma coisa nobre e uma nova virtude. O bom deseja o velho e que o velho continue vivendo.

O perigo do nobre, porém, não é tornar-se bom msa, sim, desaforado, desdenhoso e destruidor.

Ah! eu conheci nobres que perderam a sua mais elevada esperança; a seguir caluniaram-nas todas.

Agora vivem abertamente com minguadas aspirações, e apenas projetaram um fim de um dia para outro.

'O espírito é também voluptuosidade' - diziam. E então o seu espírito teve as asas partidas; arrastar-se-á agora de trás para diante, maculando tudo quanto consome.

Antigamente pensavam fazer-se heróis; agora são galhofeiros. O herói é para sia aflição e espanto.

Mas, por amor a mim e à minha esperança digo-lhe: não expulse para longe de você o herói que há na sua alma! Santifica a sua mais desejada esperança!"

Assim falava Zaratustra - Friedrich W. Nietzsche
Fantástica, no mínimo, é esta linha de pensamento, mas não pelo teor metáforico, mas sim pela forma como descreve o pensamento de alguém que se obriga a ser heróico e o que é heróico por natureza.

Todo livro é repleto de linhas de pensamento assim e, como bem sabem aqueles que lêem Nietzche, é onde ele prega o consciente sobre o espiritual, o material sobre o divino e o homem sobre ele mesmo. Existem várias passagens onde ele prega, sem dúvida, que o homem é um estado de transição para uma condição superior, a qual ele chama de super-homem - e não é aquele personagem de quadrinhos, mas uma condição da mente humana onde resida toda a esperança da humanidade. É como se ele pregasse a evolução do intelecto como meta para todos, mas ele deixa bem claro que é uma condição que não pode ser levada até as massas; no livro ele deixa bem claro que as massas são rebanho e que não adianta querer guiá-las para um lugar melhor, poucos despertarão para a condição de super-homem e poucos ouvirão o que o personagem do livro tem a dizer.

Zaratustra é aquele sábio persa, fundador do Zoroastrismo (o nome de Zaratustra também é Zoroastro), mas Nietzche o transforma em um tipo de anti-profeta. Sensacional! Ele quebra os valores divinos, fala sobre a preocupação com o corpo, com a condição da mente como residente deste corpo e como não devemos levar o pensamento para lugares que nos coloquem menores do que somos. A grande idéia de tudo isso é que o homem é o centro do universo mesmo, que ele deve se prezar, amar-se e tomar conta do que toca - materialismo e antropocentrismo são a essencia do discurso da obra.

É um livro que compensa muito ser lido, mesmo que você continue acreditando no divino e nos nuances mais empíricos da natureza humana.

E repito: não me sinto mais tão estranho. As idéias do livro realmente criam discussões interessantes e deveriam ser obrigatórias no processo de evolução do intelecto.

Indico a leitura, mas vou além disso! Indico que vocês abram suas cabeças, coloquem idéias novas e alimentem o ser. Esqueçam um pouco os dogmas que nos são impostos pela televisão e pelos outdores, existe vida além daí, podem ter certeza - mas não precisam deixar isso de lado, pois sábio não é aquele que larga tudo e vai viver isolado em uma montanha, mas sim aquele que vive em harmonia com tudo o que está a sua volta e consegue evoluir em meio a todos os ruídos.

Um bom dia para vocês.

4 comentários:

Anónimo disse...

Pra tudo na vida tem a hora certa ... smacks !

Anónimo disse...

.Legal, vou anotar o nome de todos aí. =*

Anónimo disse...

Nenêm, realmente qdo vc se inspira tu escreve bem pra caramba!!! ;)
Quer dizer, tu sempre escreve muito bem, mas acho q esse foi o melhor post q lí!!! =D

Talvez o tema tenha me despertado maior interesse, afinal sou uma rata de livro, adoro ler, é algo q me fascina, q me diverte!

Ainda não lí esse livro de Nietzsche, mas com toda certeza irei procurá-lo!!!

Beijinhos
=*********

Anónimo disse...

Poe, como eu sempre digo, vc eh muuuito inteligente! Tambem le livros muito bons, mas todos eles seguem mais ou menos a mesma linha de filosofia. Le esse aqui "o Delta de Venus" de Anais Nin... soh pra variar! E nao pense que nao crescera seu intelecto, pq vai sim. Uma das coisas que fazem uma pessoa crescer o intelecto, eh ter conhecimento de coisas diferentes do seu proprio eu... nao que vc nao va se identificar com esse livro hehehe... ao contrario, acho que vc vai gostar muito! Mas eh uma leitura bem diferente das que vc citou anteriormente.
Bjos Fofo!!!!